quarta-feira, 26 de março de 2008

Parte 3

“Tá, Meu? Tu é enrolado! Cadê Os Sertões?”

"Calma, meu chapa. Ainda tem mais pré-história antes..."

Depois de Escuro nós dois queríamos fazer mais quadrinhos juntos. A minha referência como criador de quadrinhos sempre foi o cinema, muito antes dessa onda das adaptações, dessa fixação do gênero super-heróis. Miller que me desculpa, mas essa onda noir nas hqs vem com outras jóias raras dos quadrinhos. Muñoz e Sampayo são os exemplos mais fortes para mim. Eu tinha essa mesma batida, ser um Chandler nas hqs (tanta modéstia), além do clima Noir, eu queria experimentar um outro gênero nas hqs, o horror. Seguir uma narrativa mais próxima dos filmes Iluminado e Exorcista. As hqs são formas de fazer filmes, é cinema no papel para mim.
O Brasil tem os seus mestres do terror nos quadrinhos, tem um estilo e identidade forte, mas a meu ver esses quadrinhos são fábulas barrocas. O que eu queria era fazer algo distante disso, algo mais real. Pegar um subgênero do terror, como os vampiros, e seguir para um outro caminho. Criei A Cura, liguei para o Rodrigo com a idéia de fazermos uma série em 24 episódios. Lavando uma enorme pilha de louça em casa, escutando o disco Pornography, da banda Cure, eu desenvolvi o argumento da série inteira. Rodrigo achou que eu tava viajando (normal), mas na primeira reunião onde mostrei o primeiro roteiro ele comprou a briga e fizemos três histórias, os três primeiros episódios.
A Cura é uma história de vampiros sem ser uma história de vampiros, é em parte um conto de horror naturalista, depois é realismo fantástico. Cinco garotos de rua fazem um pacto com o demônio, bebem sangue de animais para saciar a fome. Querem mudar as suas vidas, mas nada muda. Decidem beber outro sangue e... Ainda é inédita essa saga. Vasques deu alta força e estímulos para nós publicarmos essa série. Quase saiu em algumas publicações nacionais como a Mil Perigos e Animal, mas o Collor acabou com os nossos planos e sonhos.

domingo, 23 de março de 2008

Parte 2

Rodrigo se ofereceu desenhar esse texto para os quadrinhos. Marcamos uma reunião na casa dele para estruturar essa versão em quadrinhos e começamos essa parceria de décadas.

Na primeira reunião, levei um texto, uma estrutura básica de roteiro. Olhando para essa época, eu imagino que esse texto devia ser super ingênuo e com erros de português. Eu não tenho mais esse texto original, sinto por não ter.
Lembro que eu era tímido, usava um cabelão black power, sempre vestido com ternos Miami-vice e óculos. Que figura! Já o Rodrigo o mesmo de sempre, descolado. Parecia a personagem Moleza da série animada de tevê Archie Show. Rosa também usava óculos tipo Woody Allen. Essa primeira reunião foi realizada na Rua Saudável, no bairro chamado Medianeira em Porto Alegre. Foi ali que eu conheci os seus pais, são um casal supergente boa. Lembro do bolo de laranja e um nescau como lanche. Produzíamos um storyboard, uma das principais características na nossa parceria. Cada um foi apresentado a sua idéia da narrativa gráfica e depois o Rosa fez o raffs das páginas. Uma semana depois ele apareceu com a hq pronta na reunião da Grafar, quando a sede era no Clube de Cultura. A recepção desse quadrinho não podia ser melhor, surgiram possibilidades de publicação na revista Megazine, mas vingou na Dundum, no primeiro número. Na época, uma das revistas de quadrinhos nacionais mais lida graças ao polêmico patrocínio da prefeitura de Porto Alegre, gestão do PT. Só podia. Com o escândalo todos fomos acusados publicamente e judicialmente de incentivar a pornografia, fazer apologia às drogas e outras aventuras. Tal polêmica só ajudou a vender mais e ficamos super famosos na cidade. Dundum até foi editada no Japão. Mas o orgulho que eu tive mesmo com Escuro foi ver esse quadrinhos ser recrutado para uma exposição das cem melhores histórias em quadrinhos nacionais no centenário das histórias em quadrinhos. Isso na primeira Bienal de quadrinhos do Rio de Janeiro, lá em 1991. Os nossos originais foram para essa exposição que eu nunca vi montada e os mesmos originais nunca foram devolvidos.

sábado, 22 de março de 2008

AQG- a pré-Grafar.


Os Sertões- A luta.

Parte 1-

Falar sobre essa adaptação em quadrinhos é complexo. Tudo começou com a parceria entre Rodrigo Rosa e Carlos Ferreira, por sinal, essa parceria completa vinte anos. Começamos com uma história em quadrinhos chamada Escuro. Se não me falha a memória, o Rodrigo, que na época era um recém conhecido, uma amizade que fiz na AQG (associação dos quadrinhistas gaúchos), uma pré-grafar. A “AQG” era formada com os mais estranhos tipos nerds, fã de carterinha da Marvel e DC. Sim, eu já fui um desses, o Rodrigo não se escapa também. Lembro que as primeiras páginas que vi do Rosa me impressionaram muito e eu disse para o guri:

“Cara, tu desenha quadrinhos de verdade!”
Sim, na época o cara era um guri, tinha uns 14 ou 13 anos e eu uns 16 anos (super adulto!). Foi assim que nos conhecemos, mas começamos a trocar idéias quando rolou um evento que preparamos na AQG, um seminário sobre quadrinhos gaúchos com sede no colégio Rosário. Depois desse seminário houve a junção da gurizada com os mais experientes quadrinhistas e cartunistas, como Vasques e Santiago. Resolvemos todos nos juntarmos e surgiu a Grafar. Isso foi lá nos idos anos de 1987 e 1988. Foi nessa época que o Rodrigo me ouviu contar para o Jerri Dias a redação, um conto que eu fiz para o colégio, era o argumento do Escuro.